Há várias formas de aprender e ensinar, e não
apenas aquela propalada nos colégios e universidades. Em texto produzido
especialmente para o Alô, professor, a bióloga e professora Vera Rita da Costa,
colaboradora da CH há anos, abre o leque de opções ao educador.
Por: Vera Rita da Costa
Bióloga usa como mote livro do educador inglês Guy Claxton
para afirmar: há diversas formas de se ensinar e aprender e cabe ao professor
saber expor isso ao seu aluno. (Poderosopontes/ CC BY-SA 2.0)
Comecemos pelo bê-á-bá: como professores, certamente temos nossos olhos e
mentes muito voltados para o que é ensinar, mas será que temos clareza do que é
aprender?
O reconhecido educador Guy Claxton,
ex-diretor do Programa de Pesquisa sobre Cultura e Aprendizagem da Universidade
de Bristol (Inglaterra), nos dá algumas dicas importantes e que podem
surpreender aqueles acostumados a não pensar sobre a questão.
Para começo de conversa, diz ele, a aprendizagem não é fundamentalmente
intelectual ou aquilo que se aprende na escola por intermédio dos professores,
dos livros e dos programas de computador, entre outros recursos.
Esse é apenas um tipo de aprendizagem, culturalmente local, historicamente
recente e, em geral, bastante singular, afirma Claxton. Outras formas de
aprender envolvem, por exemplo, experimentação, imersão, imitação, interação e
imaginação.
Para o educador Guy Claxton, o
ato de aprender faz parte da natureza humana; é um desejo inerente à espécie.
(foto: Edtalks/ CC BY-NC-SA 2.0)
Sistematicamente, no entanto, esses outros modos de aprender vêm sendo
sufocados pela maneira intelectual, formal e unificada de se conceber a aprendizagem.
Pensar demais ou exigir demais o entendimento consciente das coisas, nesse
sentido, interferiria na aprendizagem, alerta o especialista.
Como assim? Então, o indicado é deixar de lado a instrução formal?
Não, nada disso. Muita calma nessa hora!
O que Claxton defende é a ideia de que há diferentes maneiras de adquirir
conhecimento e de que a sociedade atual, por meio do reforço e da
institucionalização de uma forma particular de aprendizagem, pode estar
prejudicando mais do que ajudando as pessoas a aprender (e os professores a
ensinar).
Vale a pena ler seu livro O desafio de aprender ao longo da vida, um dos
poucos desse autor publicados em português. Nele, a visão da aprendizagem como uma
adaptação evolutiva ou estratégia de sobrevivência humana fica bem clara.
Para Claxton, estar vivo é estar aprendendo e a aprendizagem não é algo que
se faz de vez em quando, em momentos ou locais especiais, ou mesmo
deliberadamente, quando se tem vontade. Aprender faz parte da natureza humana,
é uma característica antiquíssima que nos acompanha enquanto espécie.
Aprender se aprende! Eis um alerta que o especialista faz
aos professores e que deveríamos fazer aos nossos alunos,nascemos aprendizes e, gradativamente, ampliamos nossas habilidades de
aprendizagem. Aprender se aprende! Eis um alerta que o especialista faz
aos professores e que deveríamos fazer aos nossos alunos.
Agora pare e pense: alguém, alguma vez, no processo de escolarização ou de
sua formação como professor, conversou sobre esse tema com você?
Aposto que não!
Afinal, a concepção tradicional de aprendizagem que ronda nossas escolas é
diferente. Em geral, concebe-se a aprendizagem como algo diretamente
relacionado à inteligência – ou às inteligências, dependendo da linha que
se adota.
Aprender é considerado, assim, algo pré-determinado, que depende das
habilidades ou capacidades que se tem ou não se tem. Trata-se de ser competente
ou não. Ponto pacífico!
Mas as ideias de Guy Claxton são um tanto diferentes e revelam-se muito
interessantes para professores que estejam preocupados não apenas em ensinar,
mas também fazer com que seus alunos, de fato, aprendam. Ou seja, para os
educadores que acreditam que a capacidade de aprender é um bem acessível a
todos.
Segundo Claxton, há três pilares que potencializam a aprendizagem. São eles:
- A resiliência ou
capacidade de lidar com as emoções e sentimentos envolvidos na aprendizagem.
O medo, a raiva, a aversão e a tristeza são reações negativas de
autopreservação e podem tolher a capacidade do aluno. Pessoas resilientes
possuem tolerância alta para a frustração, não se deixam facilmente
perturbar com as dificuldades e, muitas vezes, as tomam como desafios.
Isso, é óbvio, potencializa a aprendizagem.
- A desenvoltura ou a
disposição para buscar e tentar novas maneiras de superar um problema.
Pessoas desenvoltas buscam e percebem recursos e estratégias variados, não
se atendo necessariamente a uma forma já aprendida ou considerada ideal.
Tornam-se, por isso, especialistas em avaliar a relevância de estratégias
e recursos diferentes e, portanto, também mais capazes de aprender.
- A reflexão
sobre os meios utilizados para resolver problemas e aprender.
Isso se traduz pela autoconsciência sobre os mecanismos e as estratégias
de aprendizado. Além disso, envolve a capacidade de monitorar e avaliar o
próprio progresso, reconhecendo pontos fortes e fraquezas.
Agora pare por um momento e reflita: se a resiliência, a desenvoltura e a
reflexão quanto à própria aprendizagem sustentam a aprendizagem, não deveriam
ser elas também motivo de aprendizagem (e ensino) na escola?
Entramos, portanto, na seara de 'o que ensinar'. Talvez, ter consciência da
importância de abordar esses tópicos em sala de aula seja o maior mérito dos
bons professores.
Vera Rita da Costa
Ciência Hoje/ SP
postado por Gislaine
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